quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Para ela.


Só por que eu sei que aquela mulher escrevia coisas bonitas, não posso deixar de pensar nessa tristeza tão quieta que lhe habitava. E quando eu olhava para ela, ali, sempre tão calada e quieta, a sensação que me dava não era de paz...Era dor. Era a dor do mundo inteiro que aquela mulher carregava dentro de si. A vi poucas vezes, estive com ela todos os dias, desde que me entendi gente. Agora, o que sinto é um desespero inabalável de me sentir só, e triste, como ela. Todo artista é artista sem querer, é artista por que a vida não te dá outra chance de pegar o bonde.
É assim que eu tento escrever, sem muito método, sem muita teorização, para levar a vida como ela: humildemente em busca dessa liberdade.
E que liberdade mais cheia de apuros! Liberdade de todas as almas, de todas as vidas entrelaçadas. E esse olhar tristeza, que ela trazia com ela, era inquietante, assustador. E foi por medo desse olhar me julgar que eu resolvi escrever. Por medo de me perder. Por medo de não conseguir nem chegar perto de entender tudo aquilo que ela havia deixado para mim. E pra você. E pra você.
Sempre que sento nessa cadeira, que acendo a luz e coloco a caneca de café ao lado, eu não faço idéia do que vai sair. Sempre sou negativa e acredito que tudo acabou e que a fonte secou. Aí, lembro dela e tudo muda, de repente me vejo com cinco novos textos, vindos assim: do nada. Ou dela. Ela comigo e eu estou condenada ao selo eterno de escritora.
Que o universo conspire para que eu nunca me esqueça de Clarice Lispector.

E nem você. E nem você.

segunda-feira, 22 de outubro de 2007

Mais uma vez e sou eu sozinha neste barco.
Naufragados, eu e ele.
Uma banheira rasa de incertezas,
Era tudo tão bonito, era tão mistério:
Eu lá, em cima daquela bandeja, me servindo de princesa.
Não era mais nada,
Só, mais uma vez eu lá, sós.
Os caras passando, as vãs correndo, as moças rindo
Eu só, sem ninguém para me trazer um destino.
Há incerteza em todos os olhares,
Mas nenhum me olha tão torto quanto o meu.
E não me importo,
Não me importo.
Se amanhã for só desconsolo, desapego,
Bato perna e choro à toa -
Vida de mulher da vida -
Me declaro santinha.

Só, como todas e nenhuma,
Cleópatra apenas minha,
Naufragada na libertinagem de uma noite,
Exausta, largada, destroçada de dignidade.
Quando acordo acelerada,
Mais uma doce nuvem-sonho que se apaga.



O espaço entre suspiros é a verdade da distância,

A importância do frágil som dos passos.

Um olhar que me busca, uma voz que me sustenta,

E só resta a poesia para este lábio de inocência.

Não é sempre que procuro no inexato,

Pois – infeliz – é quase um nada que te tenho ao lado.

Queria sentir mais o impreciso, meu, nosso imprevisto.

Só assim permaneceriam calmos meus enganos.

Tenho-te às vezes e aos poucos,

Em distâncias, passos, espaços.

Raros, loucos caros são suspiros:

Único vínculo para nosso estreito laço.

Será para sempre viver a repreenda?

Será para nunca acalmar meu desencanto.

É do e para ele – amor – que canto:

Pois que é breve, e quase sempre feliz em seu desencontro.