quinta-feira, 6 de outubro de 2011

ความสงบสุข


Perdão.
Eu escrevi uma dúzia de vezes, tentando achar um sinônimo para a minha culpa.
Mas acho que já não era culpa.
Saudades.
Era o que eu queria escrever...

Te deixei esta carta só em pensamento.
Mas como é que se explica pra quem se ama que a gente tem que fugir, tem que sumir pra não se consumir ?
Como é que eu te conto que eu vendi meu carro, aquele carro, e sumi no outro lado do mundo?
Eu te amo.
Penso em você.

Uma rádio thaï alucina meu ouvido.

Sawadee ka !
Sawadee kup.

Onde eu fui te largar ?

Eu tive um sonho um dia. Tentei te contar, mas você só comentou que o tempo andava muito seco.
Eu era um ser diferente dos outros, eu vivia ao inverso. Nada mais acontecia de fora para dentro. Tudo se passava dentro de mim, o mundo existia através do que eu via de dentro dos meus pensamentos e se realizava no exterior do meu corpo. Meus olhos viam o que o meu espírito previa.
Eu acordei assustada. Como num ataque de claustrofobia.

Já pensou se a realidade dependesse única e exclusivamente do seu próprio corpo ?

Hoje um artista me mostrou a sua casa em Chiang Mai. É uma casa museu. Ela é quase vazia, poucos móveis espalhados em um enorme espaço. Uma cama em meio a várias paredes frias. Uma cadeira, onde podemos nos deitar. Uma obra dele. Nenhuma outra decoração. A casa de concreto me parecia uma geladeira. Mas aí eu falava com ele e me sentia bem naquele lugar vazio. Ele ocupava o espaço com suas palavras. Aquele lugar numa poderia existir, se ele não morasse ali.

Hoje cheguei em uma nova cidade. Chego aqui e penso em você. Ta calor, mas é úmido. Ouço o som das águas que passam por baixo desse meu bangalô.

Amanhã volto ao trabalho. Tenho um projeto. Um filme. Quem sabe.


neve


primeiro dia de neve. meu coração estremece. em um cálculo besta, me lembro desses dedos de mármore que me tocavam há não muito. eu gritando, cantando um certo prazer cego, cheio de toques e cheiros bem milimetrados. ele me olhava de um jeito triste, como se tudo não fosse mais que um momento vago entre os lençóis daquele quarto frio. e se ele contasse aos amigos da brasileira vestida de vermelho em pleno inverno? e se eu escrevesse um filme sobre esse alemão de t-shirt azul? 
a neve engrossa, dez, dezoito centímetros do solo, e eu vou pisando firme nas lembranças leves que ele vai me deixar. nosso pequeno mistério é que vivemos em um futuro anterior, sem promessas. ele me liga, oi, eu respondo depois com um beijo, tchau. ele não entende o meu sussurro em francês mal pronunciado, e eu não levo a sério suas declarações encabuladas. eu sei que logo eu vou estar do outro lado da rua acenando para a amiga de casaco verde, e ele vai estar no alto de teleférico, dando um abraço no irmão pequeno. a gente é assim, é como a vida, é como a neve. de dentro para fora. floquinho a floquinho, enfeitando o espaço, cobrindo o ar, o mundo, e se desmanchando calmamente, quando o sol reaparece.