primeiro
dia de neve. meu coração estremece. em um cálculo besta, me lembro desses dedos
de mármore que me tocavam há não muito. eu gritando, cantando um certo prazer
cego, cheio de toques e cheiros bem milimetrados. ele me olhava de um jeito
triste, como se tudo não fosse mais que um momento vago entre os lençóis daquele
quarto frio. e se ele contasse aos amigos da brasileira vestida de vermelho em
pleno inverno? e se eu escrevesse um filme sobre esse alemão de t-shirt
azul?
a
neve engrossa, dez, dezoito centímetros do solo, e eu vou pisando firme nas
lembranças leves que ele vai me deixar. nosso pequeno mistério é que vivemos em
um futuro anterior, sem promessas. ele me liga, oi, eu respondo depois com um
beijo, tchau. ele não entende o meu sussurro em francês mal pronunciado, e eu
não levo a sério suas declarações encabuladas. eu sei que logo eu vou estar do
outro lado da rua acenando para a amiga de casaco verde, e ele vai estar no
alto de teleférico, dando um abraço no irmão pequeno. a gente é assim, é como a
vida, é como a neve. de dentro para fora. floquinho a floquinho, enfeitando o
espaço, cobrindo o ar, o mundo, e se desmanchando calmamente, quando o sol
reaparece.
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