vou largando, vou deixando. e isso vai me incomodando tanto. penso se a vida é uma corrida ou um eterno semáforo, fechado no vermelho, esperando imóvel, segundos, dias, milênios, por algum sinal mais calmo, mais reto, mais verde para nos deixar seguir em frente. sigo em frente arrebentando, vou me livrando das coisas comuns, me entregando cega, nua e perdida, a uma realidade que não existe - sim, admito - mas é mais fácil olhar para o alto, sol cegando claro, do que ver os pés correndo, vertiginosos, esperando uma direção qualquer que só mesmo a cabeça é capaz de dar. por mais que me esforce percebo quão católica sou, cheia de hábitos, crenças e medos, apavorações que só uma alma apostólica romana pode carregar. a consciência pesa em cada esquina, e as paredes me comprimem permanente. sem direito de vida, de voz, fecho os olhos e tropeço, sempre, sempre, só assim vou seguindo as guias da estrada. furando sinais, dirigindo so high a mil por hora, e atropelando gente - quanta gente - e matando animais, e tragando um ar salgado, cheio de poeira da estrada. mal comecei, mas já ando bem machucada, lacrando, quando há uma parada, meus ferimentos, à base de água e sal, vou sentindo arder cada ferida, cada gota do meu sangue que escorre, sinto uma alegria feroz, sempre seguida pela angústia de estar quebrando padrões, destruindo regras. ouço vozes, constantemente, me lembrando que a velocidade é perigosa, que um dia posso chegar a capotar - o fim da linha. mas isso - e as vozes não entendem - é coisa ora eles, que acreditam e temem o fim da linha; pra mim, a linha já começou no fim e o que me espera é o infinito. correr riscos, enxergar abismos, e me entregar inteira ao desespero de correr mais rápido. a liberdade é a maior prisão de todas. hoje cerro uma de minhas grades e olho em frente, sofrendo tanto, um remorço infantil de quem vai carregar para a vida o peso - embora pequeno - da ação escolhida.
jamais me arrependo.
sexta-feira, 25 de abril de 2008
abrir os olhos.
e é aí que o coração palpita.
abrir os olhos.
e segurar aquela mão que não vejo há vinte anos.
abrir os olhos.
e ter a certeza de aqui ao lado mora alguém.
abrir os olhos.
beber um café bem forte e ouvir armstrong.
abrir os olhos.
ler o rosa e ver godard.
abrir os olhos.
o infinito.
abrir os olhos.
é logo ali.
abrir os olhos.
somos nós.
abrir os olhos.
abrir os olhos.
e encarar os seus olhos
abertos
para mim.
e é aí que o coração palpita.
abrir os olhos.
e segurar aquela mão que não vejo há vinte anos.
abrir os olhos.
e ter a certeza de aqui ao lado mora alguém.
abrir os olhos.
beber um café bem forte e ouvir armstrong.
abrir os olhos.
ler o rosa e ver godard.
abrir os olhos.
o infinito.
abrir os olhos.
é logo ali.
abrir os olhos.
somos nós.
abrir os olhos.
abrir os olhos.
e encarar os seus olhos
abertos
para mim.
quarta-feira, 16 de abril de 2008
segunda-feira, 14 de abril de 2008
Cadernos . 1

Não. eu não costumo fazer isso, escrever sobre filmes, mas este aqui eu achei necessário.
Amores expressos. e andei pensando. cheguei à conclusão de que nada é mais Wong Kar-Wai que amores expressos. diretor apaixonado, kar-wai me parece um eterno desbravador dos conflitos amorosos que ultrapassam os seres humanos, um ambicioso em tentar configurar, dentro deste contexto, a insustentabilidade do espaço e do tempo. este é o meu wong kar-wai. e é por isso o acredito e procuro uma justa defesa para o que se comenta por aí sobre seu novo filme: My Blueberry Nights.
apresentando. o filme é, mais uma vez, um condensado kar-wai, mas aqui enlatado à la USA, e isso é o que afronta os aficcionados. kar-wai se vendeu. kar-wai caiu o nível. kar-wai virou clichê. qual o quê. kar-wai se afirmou, conseguiu usar todo seu charme para colocar seu cinema mais típico, mais estético, mais preciso, dentro de um cenário by hollywood. é difícil para os fanáticos da trilogia amores expressos, amor à flor da pele e 2046 compreender o que é esse kar-wai feito para norah jones. talvez eu também nunca chegue lá, mas tenho um palpite. ouvi pelas línguas que correm por aí, que o diretor fez esse filme como um episódio que não coube no amor à flor da pele, escrito ao tempo em que ouvia norah jones. achou na moça toda a composição que precisava para sua personagem. anos mais tarde, pensou: quem seria melhor para o papel do que a própria? e aí, só, e com mais alguns que acreditaram, resolveu filmar. até aqui, ok, mas por que USA? há de se prestar atenção ao cinema de que estamos falando. wong kar-wai é um diretor do cotidiano mais cotidiano e íntimo possível. se até hoje seus filmes tem um ritmo tal, uma composição tal, é por que foram feitos para seus atores tais: orientais, em um ambiente próprio a eles, onde nenhuma dúvida ou suspeita sobre a veracidade das coisas poderia ser posta em cheque. então. como fazer norah jones parecer autêntica em um cenário que não lhe dizia nada? falando coisas que não são do seu cotidiano, ou pelo menos verossímeis a ele? não, não. norah é estrela americana, bem americana. sua música é para o ocidente, fala dos hábitos e discordâncias da sociedade americanizada. não podia ser diferente na escolha dos atores: a própria jones, nathalie portman, rachel weiss e jude law. que vale dizer, não são medíocres por serem atores hollywood, mas são bons atores, em geral, com papéis medíocres. kar-wai soube disso, e nos deu de presente o resultado. um filme americano, no contexto mais americano de todos: nos diálogos e saídas típicas no mais completo lugar comum de filme podre comercial, no olhar exageradamente voyer em que o diretor nos coloca, no mote do casal feliz, em contraste com a decadência norte americana (rachel weiss e nathalie portman), no galã bom, bonito e ao alcance de todos (jude law), enfim, a perfeita fórmula hollywood, construída pelos olhos orientais de wong kar-wai. também gosto bastante de ry cooder assinar a trilha sonora, que mistura ritmos latinos (tão tão wong kar-wai) com jazz (na voz de norah). enfim, defendo e adoro. acho que o que temos é apenas a certeza de um diretor de peso, que não se transforma e nem cai no clichê de só fazer filmes dentro de um mesmo contexto. ao contrário, se afirma em sua posição intocável de wong kar-wai, um diretor de amores expressos, em todas as suas manifestações, não importa se ocidente ou oriente, se sai bem sempre. arrasa.
sexta-feira, 11 de abril de 2008
manifesto revolucionário parte 1:
"Minha motivação no cinema é a passagem de um estado a outro estado.
A cada instante,preparar o espectador como um pintor escolhe e mistura suas cores, ou como um músico, ou como um pagé reúne suas folhas para depois extrair delas um conjunto de sensações.
Só passamos de um estado a outro se este conjunto de sensasões existir.
Só ultrapassamos a mera construção técnica de um filme se formos capazes de gerar uma fabulação, um sonho,
com tamanha força de contaminar o escuro do cinema como uma peste.
É necessário criar um estado de vidência.
Mas a fabulação exige de nós um movimento: oferendar-se. Ir com a coragem de pertencer ao desconhecido, à tela ainda em branco.
É preciso tornar-se, liberar a vida lá onde ela é prisioneira, ou, pelo menos, abraçar este combate incerto em busca das visões.
O fruto de toda essa necessidade é a linguagem".
Luiz Fernando Carvalho
A cada instante,preparar o espectador como um pintor escolhe e mistura suas cores, ou como um músico, ou como um pagé reúne suas folhas para depois extrair delas um conjunto de sensações.
Só passamos de um estado a outro se este conjunto de sensasões existir.
Só ultrapassamos a mera construção técnica de um filme se formos capazes de gerar uma fabulação, um sonho,
com tamanha força de contaminar o escuro do cinema como uma peste.
É necessário criar um estado de vidência.
Mas a fabulação exige de nós um movimento: oferendar-se. Ir com a coragem de pertencer ao desconhecido, à tela ainda em branco.
É preciso tornar-se, liberar a vida lá onde ela é prisioneira, ou, pelo menos, abraçar este combate incerto em busca das visões.
O fruto de toda essa necessidade é a linguagem".
Luiz Fernando Carvalho
quinta-feira, 10 de abril de 2008
bum. bum. bum.
tanãnã tãranran tarãrã.
o leão da mgm me devora.
sãos ritas, frestas, hayworths e arestas.
ahhh, rá rá rá, hihihi, uhhhhhh, êêê.
são as cores, descores, marylins e amores.
sou eu de mãos dadas com carlitos,
é artaud enquadrando a crueldade de joanna,
somos nós, fazendo as malas no marrocos,
sois vós que não sabeis do último bolero em nápoles,
são eles reencostados aos flashes: paparazzo! paparazzo!
és tu, leão devorador de sonhos, janela dos meus presságios,
é quem parte minhas flores, meus lírios, meus temores.
meu, meu leão marinho de terras em transe.
tic tic.
o som que resta é o sieur lá no alto.
tic tic.
piiiiiiiim. longo. longo.
emoldurado.
luz. câmera.
fim.
tanãnã tãranran tarãrã.
o leão da mgm me devora.
sãos ritas, frestas, hayworths e arestas.
ahhh, rá rá rá, hihihi, uhhhhhh, êêê.
são as cores, descores, marylins e amores.
sou eu de mãos dadas com carlitos,
é artaud enquadrando a crueldade de joanna,
somos nós, fazendo as malas no marrocos,
sois vós que não sabeis do último bolero em nápoles,
são eles reencostados aos flashes: paparazzo! paparazzo!
és tu, leão devorador de sonhos, janela dos meus presságios,
é quem parte minhas flores, meus lírios, meus temores.
meu, meu leão marinho de terras em transe.
tic tic.
o som que resta é o sieur lá no alto.
tic tic.
piiiiiiiim. longo. longo.
emoldurado.
luz. câmera.
fim.
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