vou largando, vou deixando. e isso vai me incomodando tanto. penso se a vida é uma corrida ou um eterno semáforo, fechado no vermelho, esperando imóvel, segundos, dias, milênios, por algum sinal mais calmo, mais reto, mais verde para nos deixar seguir em frente. sigo em frente arrebentando, vou me livrando das coisas comuns, me entregando cega, nua e perdida, a uma realidade que não existe - sim, admito - mas é mais fácil olhar para o alto, sol cegando claro, do que ver os pés correndo, vertiginosos, esperando uma direção qualquer que só mesmo a cabeça é capaz de dar. por mais que me esforce percebo quão católica sou, cheia de hábitos, crenças e medos, apavorações que só uma alma apostólica romana pode carregar. a consciência pesa em cada esquina, e as paredes me comprimem permanente. sem direito de vida, de voz, fecho os olhos e tropeço, sempre, sempre, só assim vou seguindo as guias da estrada. furando sinais, dirigindo so high a mil por hora, e atropelando gente - quanta gente - e matando animais, e tragando um ar salgado, cheio de poeira da estrada. mal comecei, mas já ando bem machucada, lacrando, quando há uma parada, meus ferimentos, à base de água e sal, vou sentindo arder cada ferida, cada gota do meu sangue que escorre, sinto uma alegria feroz, sempre seguida pela angústia de estar quebrando padrões, destruindo regras. ouço vozes, constantemente, me lembrando que a velocidade é perigosa, que um dia posso chegar a capotar - o fim da linha. mas isso - e as vozes não entendem - é coisa ora eles, que acreditam e temem o fim da linha; pra mim, a linha já começou no fim e o que me espera é o infinito. correr riscos, enxergar abismos, e me entregar inteira ao desespero de correr mais rápido. a liberdade é a maior prisão de todas. hoje cerro uma de minhas grades e olho em frente, sofrendo tanto, um remorço infantil de quem vai carregar para a vida o peso - embora pequeno - da ação escolhida.
jamais me arrependo.
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