sábado, 26 de julho de 2008

o tempo. esse estranho poeta, o tempo, me deu asas de vencedor, me carregou no colo e acorrentou meus instintos à liberdade, enganou meus sorrisos, desfez meus afagos. o tempo, esse estranho conhecedor de mim, me derrubou sem piedade, me afogou na esperança de saber mais e mais, o tempo, tempo, me destruiu em pequenos cacos sabotados de certeza, me tornou incapaz, frágil e delicada, por que o tempo é o que é, é o universo e suas desvantagens para nós, é o tempo o catecismo que me corrói, é o tempo o vento que me julga, é o tempo a religião do meu algoz. sou eu o tempo. e o tempo me desncronstrói.

terça-feira, 1 de julho de 2008

...desde menino, eu não era mais que uma sombra feita à imagem do destino.
...tudo começa no teu amor, ele é o núcleo, ele é a semente, o teu amor pra mim é o princípio do mundo.

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Só pra constar.

Em um postal manchado de Jean-Luc Godard, a escritura:

Luis Fernando Carvalho,

do velho arcaico, ao jovem arcaico,
hipnótico e sifilítico e mestre de si mesmo
e maestro de todos nós.
Com admiração,

Bernardo Bertolucci.




*e o mundo é mesmo um lugar melhor.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Sólido gelo estrangulando corações

Dentro do olhar delicado é onde toco o horizonte
Na voz devastada por cacos de vidro, engulo nosso enorme edifício
O sangue rasgado, rojando em espaços de um concreto armado,
Meu coração desliza na poça de barro

De dedos em chagas evaporam borboletas de fogo
Asas quebradas e toque voluptuoso
Carros vagueiam por entranhas de um cérebro vasto
A única via possível é em vermelho vibrante: Percalço!

Aviões embreagados acordam os ouvidos sinceros
Da língua afiada, a mordida vira palha,
Queimando em fiapos esse mármore virgem,
Não trabalhado, corpo exaurido, de humor cultivado
Donde serpenteiam correntes de aço.

Resista, herói, aos tumores e ardores
A carne quente, aberta em feridas,
Sangrando desprendida do que é meu e seu
Segura essa saliva que corrói agora esses belos lábios
Dispersa a preguiça da exaustão de ser infinito
Ignora a construção perfeita disso chamado bem
Esfrega no seio a insegurança do despeito
Se joga nessa cama de pregos
Aguarda a redenção,
Ou te perde,
Ó, solitário coração.

domingo, 22 de junho de 2008

Ele me toca e, toda rubra, me fecho
Eu agrido aquelas mãos delicadas
Meus espinhos cravados
O sangue dele me acalma

Ele exala meus perfumes
Eu me desmancho suave em seu travesseiro
Minhas pétalas dispersas
O suor dele me acalanta

Ele me observa e caio pálida sob si
Eu escondo aqueles olhos de ferro
Meu orvalho escorrendo
O gozo dele me estremece

Ele chora em mim
Eu acaricio seu abraço
Minhas lágrimas derramando
O amor dele, meu encalço.

sábado, 7 de junho de 2008

Eu fechei aquela porta
Na poeira deserta
Na sobra do antes,
Sal de todo o afeto que aqui esteve

Eu fechei aquela janela
Com dedos fracos
Toquei a imensidão
Infinito de toques e cheiros
Dispersos na madeira ruída
Donde passeiam calcanhares
E rangem os amores

Eu levantei aquele lençol sob a mesa
O ar passando
Arrastando em si a poeira
Das ceias, das festas
Das meias jogadas.

Eu cerrei aqueles olhos,
Num prazer cego de entender tristeza
Num ruído silencioso de viver tragédia
Na esperança de ter conhecido amor

Eu tirei os meus sapatos
Com a calma de quem anda montanhas
Subi meus abismos
E encontrei aquele sorriso
A mão quente
Os pés gelados debaixo da fronha

Eu abri os meus braços
O vento sorriu
A blusa se abriu
A saia caiu
O moinho carregou os meus sentidos

Eu fechei os meus olhos
E permiti a correnteza
Levar meu corpo nu
Coberto de rubor
Cansado de pudor
Disperso, perdido, arrastado
Em cada grão da casa que restou.

os bitu.

estranho. estava eu catando as saudades do meu quarto, e me deparei logo com john-paul-george-ringo. uma coisa simples, que seria rever uma velha coleção de lps, me deu essa sensação amarga, triste, de quem perdeu entes queridos. me fiz pensar sobre as escolhas, sobre os caminhos que ando seguindo, tão diferentes do que eu sonhava. quinze anos, quinze anos que foram ontem, não faz tempo não, mas por que é que me parece ter abandonado uma vida inteira quando penso nesses meus quinze anos? cabelo comprido, óculos, aparelho ortodôntico, e uma vontade tremenda de ser rock star. por que é que eu larguei tudo isso? o paz e amor, os meu garotos que eu cultivava com tanto carinho? hoje percebi, miseravelmente, que os meus beatles de agora não são mais os de antes e a gente não pode carregar tudo de uma só vez nessa viagem que é a vida. os retalhos vão ficando jogados pelos anos e o que sobra é saudade, nostalgia, melancolia. no rio que os beatles correm, não tinha espaço para um monte de outras coisas, e eu tive que abrir mão, me entregar a novos acordes e melodias cada vez mais divididas. me sinto envergonhada por ter largado o que eu mais amava. mas acho que é isso aí: a gente fica e é a vida que corre na frente, levando as lembranças, memórias e amores, o que resta é pó, cicatriz antiga do que já se viveu.



you don't realize how much I need you, at the penny lane street, dancing with lady madonna, eating strawberry fields, while Lucy is wating for us in a sky full of diamonds. Eleanor Rigby showed compassion for you, and told Mr. Nowhere Man about all the little things you do; now he had invited us to join them at the yellow submarine, in a trip of knowledges, where we'll discover that all we need is luv, and fab four forever.

domingo, 1 de junho de 2008

re-começar. partir de um ponto qualquer que me conduza à eternidade desenterrada, des-coberta. atravessar continentes para me perder em outras línguas, em outros passos, outros suores. desconhecer mim mesma para desvendar eu. e por mais assustador que pareça deixar tudo, o abismo é desconcertantemente sedutor. deixar as pessoas, deixar os processos, inquéritos, débitos, deixar a responsabilidade que a convivência carrega. largar tudo e me permitir fazer parte do mundo. já sinto falta de tudo, e na minha saudade começo a gostar mais das coisas e pessoas do que antes. ilusão ilusão.

sábado, 24 de maio de 2008

vou viver de chuva.
me desfazer de desesperanças, desventuranças,
me entregar toda à nova onda.
vou viver de chuva,
esquecer olhares, retratos, descrenças;
dançar inteira ao som das gotas no ar.
vou viver de chuva,
não catar ninguém, não dividir nada, não encobrir tudo;
na condenação confirmada, o importante é viver
de chuva,
de vento,
de rostos,
de lábios,
de ares,
eternamente,
vou viver de chuva,
e me afogar em tudo o mais que me quiser arrematar.

terça-feira, 20 de maio de 2008

respiro. respiro. como se fosse possível sugar todo ar do universo nesses suspiros, suspensos, dispersos entre onde estou e aquele ali começa. é criador e perigoso catar alturas, ternuras. um passo em falso, a pedra rola, o dia acaba e tudo não era que sonho, além do que eu esperava viver. respiro, por que é nesse swingado de ar que tenho a eternidade ao meu alcance. respiro, num sopro leve que me impulsiona longas distâncias, longas corridas, longas descidas, até cair na desventura, no desconsolo, nas desavenças. despertar em chamas, em risos, em gritos, por que é disso que se vem tristeza, de consolidar o que resta de insegurança. respiro, e desses cheiros, sinto aquele tal, tão próximo, vulgarmente conhecido, nesse meu íntimo mais perdido, ai ai ai, são de todos esses ares do mundo donde saem esses perfumes cor de blue, cor de mim, tocando lábios avermelhados de rubor e desvendando novas texturas. respiro, respiro, respirooooooooooo. e vivo longas, lindas, eternas travessuras.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

«Cahiu-me a alma a uma latrina, preciso um banho por dentro

[Eça de Queirós]

domingo, 4 de maio de 2008

um pocuchinho de tranquilidade e ele não entende o meu olhar blasé, tão sem sugestão, tão sem carícias. era um olhar qualquer, tão perto de mim in ti, era um desses olhares simples que a gente joga pro alto sem nem imaginar que alguém vai se importar.

é aí que ele me cata, me pega, me arrasa. desconfortável, doloroso, inquietante calor que brota de uma indiferença. tanta descrença e a vida dança entre segundos, seguros, suspensos em dois olhares que se cruzam.

não palavra e minha respiração já foi.

tão embora, nesses lindos, rasos, inquientantes olhos de adeus.

a deus.

domingo, 27 de abril de 2008

vou largando, vou deixando. e isso vai me incomodando tanto. penso se a vida é uma corrida ou um eterno semáforo, fechado no vermelho, esperando imóvel, segundos, dias, milênios, por algum sinal mais calmo, mais reto, mais verde para nos deixar seguir em frente. sigo em frente arrebentando, vou me livrando das coisas comuns, me entregando cega, nua e perdida, a uma realidade que não existe - sim, admito - mas é mais fácil olhar para o alto, sol cegando claro, do que ver os pés correndo, vertiginosos, esperando uma direção qualquer que só mesmo a cabeça é capaz de dar. por mais que me esforce percebo quão católica sou, cheia de hábitos, crenças e medos, apavorações que só uma alma apostólica romana pode carregar. a consciência pesa em cada esquina, e as paredes me comprimem permanente. sem direito de vida, de voz, fecho os olhos e tropeço, sempre, sempre, só assim vou seguindo as guias da estrada. furando sinais, dirigindo so high a mil por hora, e atropelando gente - quanta gente - e matando animais, e tragando um ar salgado, cheio de poeira da estrada. mal comecei, mas já ando bem machucada, lacrando, quando há uma parada, meus ferimentos, à base de água e sal, vou sentindo arder cada ferida, cada gota do meu sangue que escorre, sinto uma alegria feroz, sempre seguida pela angústia de estar quebrando padrões, destruindo regras. ouço vozes, constantemente, me lembrando que a velocidade é perigosa, que um dia posso chegar a capotar - o fim da linha. mas isso - e as vozes não entendem - é coisa ora eles, que acreditam e temem o fim da linha; pra mim, a linha já começou no fim e o que me espera é o infinito. correr riscos, enxergar abismos, e me entregar inteira ao desespero de correr mais rápido. a liberdade é a maior prisão de todas. hoje cerro uma de minhas grades e olho em frente, sofrendo tanto, um remorço infantil de quem vai carregar para a vida o peso - embora pequeno - da ação escolhida.




jamais me arrependo.
Eu.
que não sabia que o amor requer vigília.

...

sexta-feira, 25 de abril de 2008

abrir os olhos.
e é aí que o coração palpita.
abrir os olhos.
e segurar aquela mão que não vejo há vinte anos.
abrir os olhos.
e ter a certeza de aqui ao lado mora alguém.
abrir os olhos.
beber um café bem forte e ouvir armstrong.
abrir os olhos.
ler o rosa e ver godard.
abrir os olhos.
o infinito.
abrir os olhos.
é logo ali.
abrir os olhos.
somos nós.
abrir os olhos.
abrir os olhos.
e encarar os seus olhos

abertos

para mim.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Para as abelhas, o mel; para o amor, o coração.
pour l'amour, la sucrerie ; pour le coeur, les abeilles.
für die Liebe die Süßigkeit; für das Herz die Bienen.
для влюбленности, конфета; для сердца, пчелы.
for the love, the candy; for the heart, the bees.
per l'amore, la caramella; per il cuore, le api.
para el amor, el caramelo; para el corazón, las abejas.

segunda-feira, 14 de abril de 2008

Cadernos . 1




Não. eu não costumo fazer isso, escrever sobre filmes, mas este aqui eu achei necessário.

Amores expressos. e andei pensando. cheguei à conclusão de que nada é mais Wong Kar-Wai que amores expressos. diretor apaixonado, kar-wai me parece um eterno desbravador dos conflitos amorosos que ultrapassam os seres humanos, um ambicioso em tentar configurar, dentro deste contexto, a insustentabilidade do espaço e do tempo. este é o meu wong kar-wai. e é por isso o acredito e procuro uma justa defesa para o que se comenta por aí sobre seu novo filme: My Blueberry Nights.

apresentando. o filme é, mais uma vez, um condensado kar-wai, mas aqui enlatado à la USA, e isso é o que afronta os aficcionados. kar-wai se vendeu. kar-wai caiu o nível. kar-wai virou clichê. qual o quê. kar-wai se afirmou, conseguiu usar todo seu charme para colocar seu cinema mais típico, mais estético, mais preciso, dentro de um cenário by hollywood. é difícil para os fanáticos da trilogia amores expressos, amor à flor da pele e 2046 compreender o que é esse kar-wai feito para norah jones. talvez eu também nunca chegue lá, mas tenho um palpite. ouvi pelas línguas que correm por aí, que o diretor fez esse filme como um episódio que não coube no amor à flor da pele, escrito ao tempo em que ouvia norah jones. achou na moça toda a composição que precisava para sua personagem. anos mais tarde, pensou: quem seria melhor para o papel do que a própria? e aí, só, e com mais alguns que acreditaram, resolveu filmar. até aqui, ok, mas por que USA? há de se prestar atenção ao cinema de que estamos falando. wong kar-wai é um diretor do cotidiano mais cotidiano e íntimo possível. se até hoje seus filmes tem um ritmo tal, uma composição tal, é por que foram feitos para seus atores tais: orientais, em um ambiente próprio a eles, onde nenhuma dúvida ou suspeita sobre a veracidade das coisas poderia ser posta em cheque. então. como fazer norah jones parecer autêntica em um cenário que não lhe dizia nada? falando coisas que não são do seu cotidiano, ou pelo menos verossímeis a ele? não, não. norah é estrela americana, bem americana. sua música é para o ocidente, fala dos hábitos e discordâncias da sociedade americanizada. não podia ser diferente na escolha dos atores: a própria jones, nathalie portman, rachel weiss e jude law. que vale dizer, não são medíocres por serem atores hollywood, mas são bons atores, em geral, com papéis medíocres. kar-wai soube disso, e nos deu de presente o resultado. um filme americano, no contexto mais americano de todos: nos diálogos e saídas típicas no mais completo lugar comum de filme podre comercial, no olhar exageradamente voyer em que o diretor nos coloca, no mote do casal feliz, em contraste com a decadência norte americana (rachel weiss e nathalie portman), no galã bom, bonito e ao alcance de todos (jude law), enfim, a perfeita fórmula hollywood, construída pelos olhos orientais de wong kar-wai. também gosto bastante de ry cooder assinar a trilha sonora, que mistura ritmos latinos (tão tão wong kar-wai) com jazz (na voz de norah). enfim, defendo e adoro. acho que o que temos é apenas a certeza de um diretor de peso, que não se transforma e nem cai no clichê de só fazer filmes dentro de um mesmo contexto. ao contrário, se afirma em sua posição intocável de wong kar-wai, um diretor de amores expressos, em todas as suas manifestações, não importa se ocidente ou oriente, se sai bem sempre. arrasa.

sexta-feira, 11 de abril de 2008

manifesto revolucionário parte 1:

"Minha motivação no cinema é a passagem de um estado a outro estado.
A cada instante,preparar o espectador como um pintor escolhe e mistura suas cores, ou como um músico, ou como um pagé reúne suas folhas para depois extrair delas um conjunto de sensações.
Só passamos de um estado a outro se este conjunto de sensasões existir.
Só ultrapassamos a mera construção técnica de um filme se formos capazes de gerar uma fabulação, um sonho,
com tamanha força de contaminar o escuro do cinema como uma peste.
É necessário criar um estado de vidência.
Mas a fabulação exige de nós um movimento: oferendar-se. Ir com a coragem de pertencer ao desconhecido, à tela ainda em branco.
É preciso tornar-se, liberar a vida lá onde ela é prisioneira, ou, pelo menos, abraçar este combate incerto em busca das visões.
O fruto de toda essa necessidade é a linguagem".

Luiz Fernando Carvalho

quinta-feira, 10 de abril de 2008

bum. bum. bum.
tanãnã tãranran tarãrã.
o leão da mgm me devora.
sãos ritas, frestas, hayworths e arestas.
ahhh, rá rá rá, hihihi, uhhhhhh, êêê.
são as cores, descores, marylins e amores.
sou eu de mãos dadas com carlitos,
é artaud enquadrando a crueldade de joanna,
somos nós, fazendo as malas no marrocos,
sois vós que não sabeis do último bolero em nápoles,
são eles reencostados aos flashes: paparazzo! paparazzo!
és tu, leão devorador de sonhos, janela dos meus presságios,
é quem parte minhas flores, meus lírios, meus temores.
meu, meu leão marinho de terras em transe.
tic tic.
o som que resta é o sieur lá no alto.
tic tic.
piiiiiiiim. longo. longo.
emoldurado.


luz. câmera.



fim.
mon paradis, ne te tries pas de moi. tu me manques et je suis perdue. mon coeur s'est levé sur les escaliers de la vie: laquelle qui montre, et l'autre, la plus importante, qui descendre. reste tout près de moi et donne à ma vie le vrai chemin à suivre. je t'aime.

sexta-feira, 28 de março de 2008

diario sentimental numero 1

não saber como agir. e assim se desculpa tudo. bebo demais, fumo demais, falo demais. depois me reencontro comigo. brava, largada, desolada, querendo retomar meu eu mais relicário em meio a tudo que extravasei. sentimentos, pensamentos, teoremas, até coisas ditas da boca pra fora demais, tentando parecer mais ágil, mais hábil, mais mulher, mais menina, mais alguém parecida com aquela que eu quero ser. não sou. não vejo. não sei. faço. demais. e nisso gostaria de saber conter. mas é que é tudo tão grande, é tudo tão vibrante, são tantas vontades, são tantas promessas, são tantas dúvidas, que me desencontro nesse labirinto. me desencontro de eu, e me estabeleço em um mim distante, preso a outras idéias, a outras cabeças. quem sou eu? navio perdido no mar da vida. cabeça desencontrada de um corpo. alma dispersa dos pés. ai ai asinhas, asitas, para donde me levarão?

eu. na verdade. nada. eu. na verdade. tudo.

de errado, de certo, de confuso, de exato.

eu. na verdade.

o meio termo?
cruzar as pernas, dobrar a alface, não fazer barulho quando beber, não beber muito álcool, fumar com elegânica, vestir com elegância, não falar alto, não se expor em público, não falar da vida pessoal, não amar a todos, não desamar ninguém, não ao sexo, não às feridas, verrugas e demais traços típicos da vida.

eu. (?)

meias fumé, cinta vermelha e um olhar fatal. elis. bebida. sexo. drogas. rock'n'roll. jazz para fortalecer.

eu?

disso nada ou tudo mais.

enquanto existir a presença

eu.

jamais saberei.

terça-feira, 25 de março de 2008

Água e vinho.

foi o vento.
e eu cantei o gismonti para dançar.
foi a voz.
e você fez café, acendeu o cigarro e girou o cd.
foi você.
e eu me debrucei na janela.
foi sua camisa azul.
e me vi nua no seu sofá.
foi a folha que caiu.
foi a terra que tremeu.
fomos nós.
e carcomemo-nos em olhos de águia.
foi o vento.
foi a voz.
foi o som.
fomos nós.

água e vinho derramados.

sábado, 22 de março de 2008

Nada.

E tudo aquilo que você me dizia ter certeza era nada. Um nada tão intenso que me tocava naquela calma preliminar de quem ama assim: preliminarmente. Olha para mim e me reconhece. Nada. Eu vejo todo o vazio nos seus olhos, e de repente me dou conta de que o vazio passa além, e transborda em lágrimas tão nulas que te fazem chorar também. O que eu queria não era isso, não era eu, e muito menos você. Você me pede calma. Você me pede compreensão: eu te amo, mas não vivo com você, não posso, dói. Dói é ver você se esquivar de mim por cordialidade, por ser assim, sempre tão habitual. E por acaso é habitual sentir? Claro que sim, a dor é nosso estado natural, meu amor. Nada. Você me olha e por fim me abraça. Que nada mais remoído, mais cheio de culpa, mais cheio de tudo. Que mãos carregadas de histórias que ficaram para trás, e para trás ficarão, nesse nada completo, como você foi um dia. Eu me afundo num desespero calado, fechado, preliminar, como tudo o mais; desespero único de quem te implora as respostas da pergunta nunca feita. Que aconchego foi esse? Que amor danado de doído foi o que você me deu? Eu sinto nada. Eu não

sinto mais nada.

E se tudo isso era apenas uma ausência, eu desisto. Você bebe, você fuma e se entrega aos vícios todos de onde não tiro prazer algum. Eu te espero. Eu te observo. Você não me diz . O que espera da vida? O que espera de mim? E o que espera do amor? Algum dia você soube o que era o amor? Algum dia soube entender esse sentir que me queimava tanto, há tanto, tanto tempo atrás? Eu olho para você e te reconheço. Meus olhos te mostram esse vazio que de tão vazio afunda nessa lágrima solitária. Como eu. Como você. Você ama. Eu amo. E o que você me diz, afinal?
Nada.

Na-da.

Quando sonho com você penso que algo muito doído está se transformando dentro de mim. Penso que sou feita de aços e cordas que te enlaçam até mesmo quando durmo. Você perto de mim demais e eu me fragilizo. Não tenho palavras nem atos com você. Sou muda. Sou nômade. Sou outras. Tento uma maquiagem que nunca funciona, um vestido novo, um falar novo, um cigarro novo que fumo tentando te encontrar dentro da fumaça do meu quarto. Você fica tão longe quando tento me aproximar de você. Sempre assim. Vou pra cama rapidamente com você por que acredito que funciona, que você vai entender esse meu ato de entrega precipitada e dizer que é feliz por me ter assim. Sua.

Não.

Você não me reconhece como sou, você não me beija quando beija meu pescoço, você não me ama quando faz amor comigo. Você não me ama nunca. E fujo de tudo isso em que eu me transformei. Vou para aquela wonderland que você supunha encontrar nos braços de outra, mais jovem, mais moderna, mais menina-mulher, mais, mais, mais. que eu. Você jamais saberá compreender a oportunidade que teve me tendo em seus braços, jamais entenderá a entrega a que eu me dispunha, jamais entenderá quem era eu. Você nunca me viu além de um corpo em chamas por você. Eu amei. E assim amarei uma eternidade. Você foi amado por inteiro, e assim não saberá jamais . Você jamais saberá ser amado de novo com a mesma intensidade.

Não se pode saber amado, se não se reconhece o amor.

sexta-feira, 21 de março de 2008

cinema:

houve sim um tempo em que a palavra falava mais alto. encantava em lá maior - e como eu adorava o lá maior. só depois é que ela passou a fazer parte do buraco mais fundo, me arrastando entre as paredes sujas do percurso.
aí, veio a luz, os olhos cegaram e o corpo passou a fazer parte de algo além. nem sei quando nem como foi. o coração desatou em luzes e espelhos que me inspiravam, era tudo fantasia: a mais cruel realidade.

terça-feira, 18 de março de 2008

à côté de chez quelq'un.

o sopro desabador de portas marré bateau. bateau. bateu le coeuração pesado num canto melódico do pensamento, onde um gato arranha minhas entranhas e aranhas me agarram com desprezo. sou less real-less: gosma de um sangue seco, boca rasgada, adormecida. sou passo-dado (past) dessa ferida. o fastama mais real. tous sont les fantômes, fan-te-homem. você pactuando com a minha amarga falsa mi hija ida, enquanto bob dylan me seduz em frente a milhões. fugir fugir. eu na velha lambreta do travolta, às voltas com louise, enchendo a cara em mullohand drive, desertando truffaut, amando john lennon. aos sexos e touchs com billie blue, que toca cítara no telhado, (yo) desabar nua em cima do louvre - (moi) l'ouevre d'art - télévision, cinéma, littérature. terra. take me home. take me home. recortes, cores, flashes do antigamente, desencontros marcantes something like "don't talk with strangers" (on a train). corri o mundo em 40 dias e me soltei: pura, leve, andorinha, por uma vida onde me perdi. I wanna fly way, take this world to yesterday, all my troubles seemed so far away. de asas quebradas só queria andorinhar por aí. o buarque, me chama e é hora de dormir léver léver leve sono. seis da manhã. seis e dez-e-nove horas, passou en retard la parole. não sou rainha je ne regrette de rien não sou princesa if shit could shit, it would smells just like jack. nem vadia la doce vita nem eu mesma. acordo nobre-claire-sex-seca.

domingo, 16 de março de 2008

Aos meus 16 anos.

Hoje me deu um arrepio tenebroso de saudade. quando coisas assim acontecem, é impressindível relembrar.

As dedicatórias:

Ao amado Lipe, um texto escrito para ele, e tão somente. Para que eu nunca me esqueça da sua sensibilidade extrema, sua luz, e que seu carinho continue eterno dentro de mim.

Em memória d'A Cólica, minha maior educação.

À Elisa Lucinda, por alguns ensinamentos básicos.

A todos os grandes pastelões e melodramas, inspiradores eternos.

Ao extinto grupo de estudos teatrais Diatribe, de onde trago este texto.

Travesti

Lava roupa todo dia, que agonia
Na quebrada da soleira, que chovia
Até sonhar de madrugada, uma moça sem mancada
Uma mulher não deve vacilar

(Tom de mulher barraqueira)

Uma mulher não deve vacilar. Uma mulher tem que lavar, passar, cozinhar e, acima de tudo, saber chorar e amar. Filho no colo, peito aberto: Mama, mama, mama...filho duma puta! (deboche) Puta? Quem? Eu?...Imagina, doçura. ( De susto) E por quê não? Mulher tem que saber ser puta também. Puta da mãe, puta do homem, mãe, puta, família, delicadeza e doçura.

(Em outro tom: de menininha)

Quando eu era pequena, minha mãe me dizia que tinha que ter jeito. Me vestia em cada vestido bordado que ela fazia, brinco pra lá de bonito...e, ai...aqueles sapatos!

(Barraqueira)

Gostosa? Gosssssstosaaaa sim, xuxu! E com muito talento!! (huhuhu)(Tom masculino de voz) Cole, ô rapa?! (tom bem feminino, até meio falso) Por que tipo de moça me tomas? Sou santa...san-ta! (gargalhada) Um salto no pé, um beijo na boca, roupa cintada, cabelo enfeitado...sabe como é: coisa de mulher.

(voz de homem)

“Mas deixa disso, homem! Pare com essas coisa, ta vendo...até parece que é qualira”

(mulher ofendidíssima)

Qualiraa? Bichona? Tra-ves-ti???Ah...eu rodo a baiana. sou é MULHER! Muito mais do que muitas por aí...que que adianta ter e não saber usar? Maquilagem, decote, mini saia...

Mulher é mais beleza e mais verdade em tudo. Já viu mulher morrendo? Eu já! E homem, já viu? Mulher quando morre mais parece que vai tirar o filho da forca, nunca vi: grita, esperneia.luta até o último. Homem não...homem quando vê a morte, já se afrouxa todo e morre de vez que é pra não dá trabalho. Mas mulher...mulher tem filho e marido esperando em casa, tem que fazer o jantar, lavar e passar...não pode morrer por uma merda qualquer não...e não morre.

É por isso que somos assim...Por que a sina de toda mulher é amar e sofrer. E aqui estou. MULHER...parada...calada...só esperando o dia de ser sofrida...ou amada..

(sentado em frente ao espelho tirando a maquiagem)

(vai escurecendo e cantando)

Eu entendo a juventude transviada
E o auxílio luxuoso de um pandeiro
Até sonhar de madrugada, uma moça sem mancada
Uma mulher não deve vacilar

(Escuro. Uma voz no microfone):

Numa pontinha do filme malfeito
no canto da tela
um travesti triste
no meio dos três tigres.
E lá fora,
o sol era assustador




sábado, 23 de fevereiro de 2008

sempre começa calmo e doce, suave por onde o ar entra.
então, a memória começa a se prender a detalhes, coisa à toa
o estômago embrulha, os dedos dos pés adormecem, o rosto em flamas e uma agonia: cada carro na rua, cada rosto, cada blusa listrada azul-vermelha, aquele velho corte de cabelo e eu na mão, sem saber ao certo a direção.
eu choro, eu berro, me estraçalho sozinha no piso do banheiro.
não era nada, por que o nada sempre é.
e agora é o vento, brisa toma conta e eu sigo a pé.

você,


do outro lado do mundo,



agarra a outra mão.






nosso antigo retrato.

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

sim, sim, sim. por que foi desses tantos nãos que o joelho fraquejou. cortocida, pequenina, nos cacos e feridas rasgadas de mim - te vi - mão na minha cabeça (menina), mão na minha mão, talvez fosse uma pequena ajuda, talvez fosse pena, vontade de sonhar sei lá, comigo. não, mais um deles e me despedaço, não vai pra lá, resta, aqui aqui aqui, perto de mim. e ele me enoja naquele blues desconcertante, gravata beterraba e seu olhar vexame. sou noivinha, querido, quero benção e um beijinho. quero bem - querer - faz bem. amar você. não. é que não. então sim. sim, sim, sim.

au revoir, mon amour.


é.

o.


fim.

domingo, 13 de janeiro de 2008

conto de criança.

O velho Chiquitinho sempre me foi colocado como algo de raro no mundo, um homem que se diferiria dos outros em sua natureza de espírito e na qualidade de seus feitos. Minhas tias me contavam que esse havia sido um raro político honesto, que dava dinheiro do seu próprio bolso para o povo, e que era muito, muito, querido. A Xica, que, criada pela minha bisavó Antonia, e que até hoje trabalha para a família, fez questão de passar tempos relembrando-se dos feitos do homem e me contando quão bom ele havia sido para ela e da saudade que sentia de seu tempo de menina, em que seu Chiquitinho mandava buscar muito leite fresco, farinha quentinha, pão novo e tudo mais em uma abundância inacreditável.

De fato, acredito que todos gostavam do meu avô, Francisco “Chiquitinho” Ferreira Figueiredo, mas acho que por várias veredas esconde-se a verdadeira pessoa atrás de todo esse mito. E assim adoraria tentar decifrá-lo. Um homem que, de tão mitificado, acabou virando uma espécie de esfinge sagrada em minha memória infantil. Um velho sentado em sua cadeira de balanço, ao fim da ladeira, através das portas e portões abertos da Rua das Pegas, nº 9, casa 13. Cantando os bem-te-vis, que ele chamava, camaleões, lagartas e lagartixas, entre redes e retratos na varanda. O velho, lá no alto, em seu pijama listrado (me lembro bem do amarelo), com bolsos bordados na camisa, donde sempre saíam dez ou vinte contos para que os netos da capital fossem até a quitanda da esquina se entupir de besteiras. Salgadinhos, pirulitos, picolés, juçara gelada, sorvete de tapioca, chiclete azul, coca-cola, guaraná, guaraná Jesus – sonho cor-de-rosa, sonho, sonho, sonho...

Na sua morte, eu, com apenas dez anos, me lembro de vários retalhos que constituíam um ser figurado, preso a um imaginário de contos de coronéis e cangaceiros. Um homem rústico e forte, quase como o senhor de uma pequena cidade do interior do Maranhão, São João Batista, à qual ele nomeou e abrigou sua família, parentes e desabrigados da região. Lembro-me da cidade toda presente ao funeral, uns se agarrando aos montes de filhos que ele havia deixado (dezesseis, se não me falham as contas); alguns chorando calados à espreita dos muros de gesso branco da casa; velhos conhecidos e parentes, como tia Dilú, desconsolados, aos prantos desenfreados dentro dos cômodos da casa; outros se amontoando, apenas de curiosos que eram, para ver aquele rosto já inchado, de lábios roxos, com pequenos algodões enfiados nas narinas e ouvidos, as mãos entrelaçadas em cima do peito, o ar calmo, sério; e eu criança, não associando o significado da morte, assustada com a fragilidade daquele avô, deitado no caixão, que parecia me sorrir, e na minha imaginação, até me mexer a mão. Aquela mórbida miragem me parecia como algo irreal, como se tudo não passasse, ali, de uma grande representação sertaneja, com um boneco de cera, velhas fotografias, o cheiro do café do interior, e vários figurantes em prantos, que para mim, tinham algo até de cômico. E foi assim que a morte apareceu pela primeira vez na minha vida: como uma mímese de um auto, extraído de um cordel qualquer de criança, feito para divertir e não para causar qualquer sofrimento. Então, chorei, chorei, sem entender por que, e tudo passou. Meu avô passou, mas o beija-flor ficou.

sábado, 12 de janeiro de 2008

argentina para nosotros

do outro lado da latina américa é onde ele me espera.
tem mãos ásperas, de quem sabe viver,
conhece meus segredos,
prevê os meus planos,
descarta minhas verdades.
ele me olha como nunca, como nada,
não procura...
sempre encontra.